São Paulo, 04 de abril de 2020
Nº 005/20 – semana 1
Síntese geral: No âmbito internacional, as projeções continuam em constante revisão de queda dos indicadores da economia. O receio tem se voltado para possíveis desabastecimentos de produtos para a saúde e alimentos por conta das limitações das exportações impostas pelos países e a ânsia dos EUA em garantir todos os produtos para si. Os pacotes para salvar a economia continuam, com destaque para a medida do Banco Central Europeu em mandar os bancos não pagarem os dividendos como uma forma de conter uma crise do crédito e da Argentina em tensionar ainda mais a negociação em torno do pagamento da dívida. No Brasil as micro e pequenas empresas já vem sentido a dinâmica da crise, bem como o emprego e em especial o setor industrial, mais ligado as cadeias globais de suprimentos. As medidas do governo federal indicam um crescimento no investimento público e a preocupação com a austeridade tem sido relegada, embora continue no horizonte de um governo neoliberal.
I. INTERNACIONAL
1. Os acontecimentos nesse período de crise se aceleram em uma velocidade impensada. As projeções e indicadores de uma maior recessão são diariamente revistas para um quadro mais intenso de queda. E nessa dinâmica que as perspectivas para a economia dos EUA é de que irá enfrentar uma dura e prolongada recessão, com a projeção de queda do PIB feita pela Goldman Sachs de -9% no primeiro trimestre, -34% no segundo trimestre e um crescimento do desemprego para 15% (estava em 3,5% em fevereiro). No mundo, a previsão de queda do PIB é de 2% para 2020, segundo a Oxford Economics.
2. Um dos temores diante dessa crise global é em torno do comércio mundial dos bens de primeira necessidade, como os produtos de saúde e os alimentos. Tem aumentado o número de países que estão proibindo ou limitando as exportações tanto desses produtos. Para os bens de saúde apenas 3 países não cobram nenhuma tarifa sobre os produtos de saúde que são, China, Islândia e Cingapura, segundo a OMC. Sobre os alimentos o Vietnã, maior exportador de arroz, já suspendeu as exportações e diversos outros países produtores de alimentos tem caminhado no mesmo sentido, como aponta reportagem do Valor. Também assistimos uma guerra na compra por equipamentos de saúde entre os países, com os EUA usando de seu poder econômico para garantir as compras, mesmo de produtos já vendidos para outros países, com retenção das cargas em seus portos.
3. Dessa forma, os grandes pacotes econômicos para passar esse período continuam, com os EUA avaliando mais uma medida dessa vez para investimentos em Infraestrutura no montante de US$ 2 trilhões, com foco na geração de empregos, visto o crescimento exponencial de solicitações ao seguro-desemprego. Já o Banco Central Europeu mandou os bancos e instituições financeiras suspenderem o pagamento de dividendos e a recompra de ações, com o objetivo de evitar uma crise de crédito no continente, capacitando os bancos na absorção das perdas futuras. E na Argentina, as renegociações da dívida do governo podem ser postergadas para o ano que vem, mas o ministro da Economia Martín Guzmán vem afirnando que a dívida é “insustentável”.
II. PIB E CRESCIMENTO ECONÔMICO BRASILEIRO
4. As projeções do PIB nesse ano diante da pandemia do coronavírus para pode ter uma queda de 0,4% a 1,8% segundo o estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA). No caso de queda de 0,4% o isolamento seria de apenas um mês (até o final de abril), mas no caso de isolamento de três meses a queda iria para 1,8%. O pior momento de queda da PIB será no segundo trimestre com maior impacto na economia doméstica.
5. Do impacto da crise, 89% das micro e pequenas empresas já enfrentam queda no faturamento e 36% afirmam que conseguem manter o negócio por apenas um mês e outros 30% conseguem se manter funcionando no máximo mais 3 meses. O estudo foi feito pelo Sebrae, entendendo a importância do grupo que responde por 27% do PIB brasileiro.
6. O auxílio de R$ 600 aos trabalhadores informais mais discutida abaixo tem a capacidade de diminuir os impactos na atividade econômica brasileira, segundo estudo da EESP/FGV. Com o auxílio durando por três meses o montante dispendido seria de R$ 85,1 bilhões, um acréscimo de 1,2% do PIB. Com isso o impacto negativo seria de 2,1% invés de 3,3% caso não tivesse a medida. O estudo mostra que se a renda básica fosse de um salário mínimo o seu impacto no PIB seria de 3,1% compensando o choque de oferta negativo em 3,3%.
III. CONTAS PÚBLICAS E INVESTIMENTOS
7. Os dados referentes ao fim de 2019 com o Investimento público não conseguindo repor a depreciação do período com uma aplicação líquida negativa de 0,4% do PIB, a arrecadação de impostos federais de fevereiro com uma queda de 2,71%, antes dos efeitos da crise e o aumento do déficit primário para o mesmo mês em R$ 20,9 bilhões (em 2019 no mês de fevereiro foi de R$ 14,9 bilhões), reforçam que a economia não vinha decolando como afirmava o ministro da economia.
8. Os efeitos da pandemia já são observados nas importações em queda na balança comercial de março de 4,5% em relação ao mesmo mês de 2019. As exportações também tiveram um recuo de 4,7%. O superávit de janeiro a março é de US$ 6,14 bilhões, sendo 33,1% menor que o mesmo período de 2019.
9. Com as medidas implementadas pelo governo federal, o investimento público no primeiro trimestre já teve um crescimento de 15% no período segundo a ONG Contas Abertas. O principal ministério que teve aumento foi o da Saúde e da Educação com um aumento de 85,5% e 64,4% respectivamente. Só no mês de março o aumento foi de 102%. Pelo BNDES a linha de crédito para ampliação dos leitos e equipamentos é de R$ 2 bilhões. O banco também irá aportar capital nas empresas com dificuldades e uma linha de crédito de R$ 40 bilhões para pequenas e médias empresas.
10. Dessa forma a previsão para o déficit primário já subiu para 5,55% do PIB, segundo o Ministério da Economia, sendo o maior impacto fiscal no auxílio emergencial aos trabalhadores informais, desempregados e microempreendedores individuais (MEIs). As demais ações do ministério estão organizadas nesse link eu sua página da internet. Com isso a dívida bruta pode chegar a 90% do PIB esse ano em um cenário chamado de “otimista” pelas agências de consultoria, que seria retomada da austeridade fiscal pós a passagem da pandemia, ano passado o indicador fechou em 76,8%
11. O risco dessa corrida por linhas de crédito é que as taxas de juros aumentem por parte do setor privado estrangeiros e nacionais, com o receio das empresas não terem condições futuras de arcar com seus compromissos. O presidente da Febraban afirma que os juros se mantém estáveis e que se houve altas foram pontuais, embora afirme que os bancos trabalham essas taxas com análises de risco e em uma conjuntura mundial incerta, esse fato pode vir a ocorrer.
IV. INFLAÇÃO E PREÇO DOS ALIMENTOS
12. A inflação, embora não aponte ser um risco nesse período, para o mês de março apontou crescimento de 1,24% pelo IGP-M/FGV, por conta da corrida aos supermercados e farmácias, elevando os preços dos seus produtos. Os alimentos tiveram uma variação de 1,64%, com destaque para o tomate que subiu 13,3%, os ovos subiram 9,04% e batata em 5,2% segundo estudo da FGV.
V. MERCADO DE TRABALHO E RENDA
13. A reação no emprego já tem sido observada com mais de 86% dos trabalhadores informais já sentiram o impacto na redução das vendas e serviços prestados, segundo estudo da Data Favela nas periferias do Brasil. Segundo o estudo, 54% dos trabalhadores das favelas são autônomos e apenas 30% dos microempreendedores são formalizados.
14. A taxa de desemprego medida pelo IBGE no trimestre móvel em fevereiro mostrou um aumento de 0,5%, fechando em 11,6%, com mais de 12,3 milhões de pessoas desempregadas, no último trimestre a taxa estava em 11,2%. A taxa de desalento manteve estável nesse período com 4,7 milhões de pessoas.
15. O Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e Renda do governo federal, a Medida 936 é analisada pelo DIEESE nessa Nota Técnica, como mais uma iniciativa que se soma as anteriores como a aprovação pelo Congresso Nacional do Projeto de lei 1.066/2020 que instituiu a Renda Básica Emergencial. Fazem um resgate de medidas semelhantes pleiteadas pelo Movimento Sindical e as críticas a essa MP.
VI. INDÚSTRIA E AGRONEGÓCIO
16. Os dados do IBGE que medem a produção física para o mês de fevereiro, apresentou um crescimento de 0,5%, além de uma revisão do crescimento de janeiro de 0,9% para 1,2%. Contudo, no acumulado de 12 meses ainda indica uma queda de 1,2%. O crescimento foi puxado pelos bens de capital com uma alta de 1,2% em relação a janeiro e dos bens intermediários com um crescimento de 0,5%. No acumulado do ano (janeiro e fevereiro) a queda é de 0,6% em comparação ao mesmo período de 2019.
17. Os setores mais dependentes da cadeia de suprimentos global têm sentido mais duramente o impacto, por conta da desestruturação que vive essas cadeias globais. Sendo a indústria eletrônica a que mais vem sentido os efeitos com uma queda na produção em fevereiro de 7%, entre os principais produtos os de equipamentos de comunicação apresentou queda de 19,3%.
18. A indústria do Petróleo e Gás não tem ficado para trás, com a queda do preço do petróleo atingindo o nível mínimo em US$ 20, vem pressionando cada vez mais as indústrias do setor, uma queda de 50% no mês. Contudo, com o anúncio de Donald Trump em que tinha acordado com a Arábia Saudita e Rússia de reduzirem a produção em 15 milhões de barris por dia, o setor teve um leve aumento nas expectativas, mas a Rússia negou ter dito qualquer conversa nesse sentido.
André Cardoso
Instituto Tricontinental de Pesquisa Social
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