São Paulo, 11 de abril de 2020
Nº 005/20 – semana 2
Síntese geral: No âmbito internacional, os principais países continuam injetando recursos na economia para atenuar os efeitos da crise, bem como o FMI que vem enfrentando certa resistência dos EUA por conta disso. A indicação que a briga em torno da produção do petróleo entre Arábia Saudita e Rússia podem dar certo fôlego ao setor que se encontra com um excedente de produção enorme. A economia brasileira já vinha apresentando queda antes dos impactos do Covid-19, como mostra a Pesquisa Mensal de Serviços e agora tem se intensificado já atingindo boa parte dos demais setores. As ações do governo continuam ambíguas, tentando salvar o aumento da CSLL dos bancos, no sentido contrário da proposta dos auditores fiscais que apresentam um aumento na arrecadação no período da crise. A inflação veio baixa em março, mas para o grupo de alimentos apresentou uma alta considerável. As medidas para o emprego além de não conseguir evitar um aumento do desemprego no médio prazo, retiram recursos da economia, empurrando para uma depressão futura. E na indústria, mesmo com o apoio da CNI as medidas, muitas lacunas são levantadas como a dificuldade de acesso ao crédito e um impacto mais intenso em um dos principais setores da indústria, o setor automotivo.
I. INTERNACIONAL
1. As medidas para conter um colapso maior da economia são o foco dos países e organismos internacionais. Uma síntese das principais propostas para o emprego e a renda podem ser lidos nesse artigo de Iriana e Pietro da UNICAMP. Mas não sem gerar tensões e indicando a preponderância do poder econômico acima das vidas, como mostra a posição dos EUA diante do plano emergencial do FMI para injetar liquidez na economia global. O FMI propôs injetar US$ 500 bilhões de Direitos Especiais de Saque (moeda escritural da instituição) para ajudar os países emergentes e em desenvolvimento, mas encontra resistência dos EUA (que tem o poder maior na instituição), pois entende que essa emissão tem a capacidade de diminuir a importância do dólar e seu poder de emissor maior.
2. A Arábia Saudita e Rússia chegaram a um acordo para reduzir a produção de petróleo em 10 milhões de barris diários entre os meses de maio e junho, com o objetivo de reverter a queda do preço do petróleo no mundo. A expectativa da OPEP é que a demanda por petróleo nessa crise caia em 30 milhões de barris por dia, dessa forma o acordo ainda assim não evitará a crise de excesso de oferta do petróleo hoje. Além disso, Trump ameaça taxar as importações de petróleo como instrumento de contenção da entrada do produto em território nacional.
II. PIB E CRESCIMENTO ECONÔMICO BRASILEIRO
3. Os primeiros indicadores do mês de março apontam uma queda para o mês de abril. A análise de movimentação feita pelo Google, mostra que houve uma queda de 70% da circulação de pessoas no varejo e recreação. Os licenciamentos de automóveis caíram 15,02% em março, as consultas ao SPC em São Paulo tiveram uma queda de 34,4% no mesmo mês, indicando o esfriamento da economia. Além disso, os dados de endividamento das famílias cresceram para 45,17%, com um comprometimento da renda com pagamento de dívidas em 20%. O desaquecimento da economia já mostra impacto no consumo, com aumento do endividamento e dificuldade de acesso ao crédito, por conta dos riscos que os bancos não desejam passar.
4. Antes mesmo da crise impactar a economia, os dados sobre os Serviços medido pela Pesquisa Mensal de Serviços (PMS) do IBGE apresentou queda de 1% para o mês de fevereiro. A queda mais intensa desde julho de 2018, revertendo o crescimento de 0,4% de janeiro. A queda no setor de serviços, sem levar em consideração a crise instaurada em março, já indicava um esfriamento na economia, pois tal índice precede a demanda dos demais setores, como da indústria.
5. No intuito de impedir um aumento na restrição ao crédito com fuga dos recursos, o Banco Central comunicou a proibição temporária da distribuição dos dividendos para as empresas acima do mínimo obrigatório, além do não pagamento de juros sobre capital próprio e o aumento de remuneração fixa ou variável dos administradores, como mais uma medida do banco para enfrentar os efeitos do Covid-19 na economia.
III. CONTAS PÚBLICAS E INVESTIMENTOS
6. Com o impacto da crise e as medidas aplicadas pelo governo federal, as projeções para as receitas da União é de queda de mais de R$ 150 bilhões esse ano tanto por conta da queda da arrecadação dos tributos, como dos royalties do petróleo, concessão de serviços públicos, venda de ativos e dividendos de empresas estatais. Como medidas para amenizar esse impacto, os auditores fiscais apresentaram dez propostas tributárias emergenciais que pode aumentar a arrecadação em até R$ 267 bilhões em 12 meses.
7. Mas indo no sentido contrário, o governo tenta amenizar a proposta do Senado que aumentaria a taxação da Contribuição Social sobre Lucro Líquido (CSLL) para os bancos e instituições financeiras. A estratégia para impedir esse aumento, segundo o Valor Econômico, é empurrar a proposta para o campo de discussão da reforma tributária, impedindo seu aumento agora como medida emergencial.
8. Das medidas do governo, algumas que tem destaque essa semana refere-se à autorização de saque do FGTS de até um salário mínimo por trabalhador. A estimativa do governo é que seja zerado as contas de 80% das pessoas com esse saque. O outro tema é a negociação da PEC do Orçamento de Guerra, que tem como grande preocupação o poder dado ao Banco Central em ter o poder de comprar e vender títulos do Tesouro e privados.
9. Por fim, a disputa entre as Aéreas e o BNDES sobre o preço de debêntures como um pacote de ajuda ao setor. Na proposta do banco de apoiar com R$ 3 bilhões cada empresa, no valor das ações hoje ele teria o controle de 47,1% do valor de mercado da Gol, 39,2% da Azul e 29,1% da Latam. Por isso a briga é que a compra das ações seja feita com os valores pré-crise que jogaria o controle do banco para 21,5%, 16,5% e 11,7% respectivamente.
IV. INFLAÇÃO E PREÇO DOS ALIMENTOS
10. A inflação medida pelo IPCA/IBGE do mês de março foi de 0,07%. O menor para o mês desde o início do Plano Real (1994). Contudo o preço dos alimentos foi o que indicou maior crescimento fechando em 1,4% para alimentação no domicílio. As maiores altas foram da cenoura (20,39%), da cebola (20,31%), do tomate (15,74%), da batata-inglesa (8,16%), do ovo de galinha (4,67%). Os que tiveram maior queda foram no setor de transporte com um recuo nos preços das passagens aéreas (-16,75%) e dos combustíveis (-1,88%). O que irá auxiliar nas contas das famílias é a medida de o desconto de até 100% nas contas de luz por 90 dias, como uma das ações contra os efeitos da pandemia.
V. MERCADO DE TRABALHO E RENDA
11. As previsões para o número de desempregados podem chegar a 24 milhões de pessoas, podendo chegar a 22% na taxa de desemprego. E com uma taxa de informalidade de 40,6%, segundo o IBGE, as medidas para amenizar as perdas mostram grande dificuldade de chegar na ponta. A benefício temporário de R$ 600 para esse setor terá grande dificuldade de chegar a mais de 20 milhões de pessoas que não estão cadastradas em nenhum órgão do governo, como mostra artigo no Valor Econômico.
12. Embora o governo afirme que as medidas salvarão 9 milhões de empregos, o que os analistas tem apontado que as ações não só apenas não conseguirão evitar uma piora no mercado de trabalho, mas também uma redução brusca na massa salarial, com uma perda de R$ 8 bilhões em 2020, como mostra o estudo de Marcelo Manzano e Pietro Borsari que fazem projeções sobre a MP 936 (Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda), avaliando que a proposta nos empurrará ainda mais para uma depressão.
VI. INDÚSTRIA E AGRONEGÓCIO
13. Na indústria, um dos setores que mais estão demandando ações do governo federal, o principal ponto é o acesso a capital de giro para passar por esse momento. A CNI avalia as medidas do governo como positivas, mas se preocupa como conseguirão chegar de fato a indústria. A queda na demanda e dificuldades na cadeia de suprimentos e logística, bem como a dificuldade no acesso ao crédito são outros problemas apontados em outro estudo da confederação.
14. O setor automotivo apresentou uma queda de quase 90% de suas atividades por conta na segunda quinzena do mês de março, fechando o mês com uma queda de 8% na sua produção. Março comparado ao mesmo mês de 2019 teve uma queda na produção de automóveis de 21,1%, as exportações para o mesmo período tiveram o mesmo índice de queda. São 63 fábricas paradas e 123 mil empregados atingidos. Em sua apresentação dos resultados do mês, a Anfavea também aponta quais as ações das montadoras e um quadro do impacto no PIB das políticas fiscais para combate à Covid-19 implementadas nos principais países.
André Cardoso
Instituto Tricontinental de Pesquisa Social
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